Mais um Carnaval que se encerra no calendário, embora sobrevivam eventos momescos fora de época. Os festejos, rituais e acontecimentos do período tiveram intensidade na vida de comunidades e de pessoas. Multidões celebraram, outras tantas se refugiaram no conforto do lar ou em lugares recônditos. Excessos aconteceram, como sempre. A sátira de costumes, social e política, inundou avenidas e clubes.
O grande carnaval das escolas de samba cariocas (hoje também das paulistas) há anos tornou-se um evento de complexa organização e realização, luxuoso, profissional, movimentando fortunas de investimentos e renda, com muita beleza e emoção a ser mostrada ao mundo. Em cidades como Salvador e Recife/Olinda, outras formas de carnavalizar, com origem na cultura local, ganharam também estruturas gigantescas, atração de turistas, mídia, profissionalização.
Nestes últimos anos tem havido reação para retorno à raiz carnavalesca: valorização, em muitos casos ressurgimento, dos blocos de rua. Esta é a era da grande massa, muita gente conectada, qualquer iniciativa pode extrapolar. Excessos antes pouco significativos, hoje produzem impactos. Não é tão simples como antigamente, quando podia sair à rua bloco com alguns instrumentos de som e um grupo de pessoas a se divertir. O mundo se complicou. Até o regresso aos primórdios do Carnaval perde um tanto da informalidade.
Desajeitado nato, nunca soube dançar e, portanto, seria candidato a não gostar de Carnaval. Mas, sempre gostei. Sem samba no pé, mas com samba na cabeça, nos olhos e nos ouvidos. Há algumas décadas, participei de comissões organizadoras do Carnaval de rua de Santa Maria. Tenho saudosa memória dessa época. O Carnaval de rua santa-mariense era pobre, mas atraia público. Sou do tempo de escolas como Acadêmicos do Samba e Vila Brasil. Outras vieram depois, como a Unidos do Itaimbé. Tinha Rei Momo, corte das Rainhas, desfile no asfalto e muitas festas em clubes. Santa Maria foi rica em associações, não só as poucas que se preservam até hoje, mas várias outras, principalmente em bairros. O Carnaval de salão era diversificado e muito animado. Como integrante da organização, visitava todos os clubes com suas majestades Rei Momo e Rainha do Carnaval da cidade.
Mais tarde, passei a ser um espectador doméstico. Virava noites assistindo pela tevê aos desfiles das escolas de samba e carnavais Brasil afora. A idade e outras condições já não me permitem tamanhas vigílias e fico a acompanhar no dia seguinte as imagens e informações.
Acostumado a costumes e excentricidades desta época de aldeia global e de pessoas revelando seus instintos pelas redes sociais, levei um choque: nunca antes um Carnaval tinha se encerrado com evento tão insólito envolvendo Chefe de Estado. Houve até um que foi surpreendido no camarote da Marquês de Sapucaí numa olhadinha indiscreta para moça sem certa peça de roupa íntima, mas replicar publicamente vídeo de cenas sexistas brutais, isso nunca acontecera. O tempora, o mores!